
Michelle Prazeresjornalista, de São Paulo, http://www.intervozes.org.br/ michelle@intervozes.org.br
Os jovens e toda a sociedade não podem mais deixar que a mídia continue decidindo no seu lugar. O direito à comunicação é um direito fundamental do ser humano.
Dizer a sua palavra, fazer ouvir a sua voz, fazer escolhas e decidir o que é melhor para a sua vida são ações deste direito.
A organização não-governamental Intervozes reúne comunicadores de todo o Brasil na luta por este direito.
- Como os jovens encaram a mídia e como se inserem no mundo da comunicação?A concepção do direito à comunicação que defendemos tem basicamente a ver com a pessoa sair da posição de público e de consumidor, porque aí existe a relação de mercado. Sair da condição de receptor e se colocar na posição de produtor, de veiculador e de transmissor de comunicação. Hoje se vive numa sociedade basicamente mediada pelos meios de comunicação. É por eles que recebemos informações, é através deles que formamos os nossos valores. Então é importante que o indivíduo se aproprie e entenda o que é a comunicação e possa se expressar nessa esfera pública. Para ser democrática, a comunicação precisa necessariamente que todos se expressem. O jovem tem uma particularidade: ele tem uma facilidade de lidar com a tecnologia, é um casamento que dá muito certo.
- Mas o jovem precisa ser crítico diante dessas tecnologias?Sim, o jovem se apropria facilmente de toda a tecnologia que vem aparecendo. É preciso que se aproprie de uma maneira crítica. É preciso que o jovem entenda por que determinada tecnologia está sendo adotada, por que a adoção de determinado sistema operacional que não é livre, por que podem optar pelo sistema livre, por que eles podem produzir um vídeo com a estética que eles acharem bacana e não com a estética do jornal que eles veem em casa na televisão. É uma questão de o jovem se apropriar daquele formato, daquele conteúdo e daquela ferramenta, mas se apropriar criticamente. E o público jovem não tem somente um encanto pela tecnologia, mas uma facilidade para entender, uma facilidade de multiplicação, porque tem a ver com a sociabilidade deles.
- Como, na sua opinião, se relacionam hoje a comunicação e a política?Acho que existem alguns tracinhos nesta relação. Uma delas é a relação intrínseca entre uma comunicação democrática e uma sociedade democrática. Para a sociedade ser democrática, precisa necessariamente que haja uma comunicação democrática. E não é isso que acontece no nosso país e em vários lugares do mundo. A comunicação é cada vez mais concentrada nas mãos de poucos. Por isso é cada vez menos democrática. Embora de interesse público, os veículos de massa têm a intenção de defender os interesses de seus donos. Acontece que esta mídia deveria ter a responsabilidade de saber que está falando para um público que não vai ter acesso a outras informações.
- Hoje, quem tem os meios de comunicação tem o poder?Existe uma conexão da política de comunicação com a política em si. É proibido pela lei que pessoas que têm concessões públicas de veículos de comunicação tenham cargos eletivos. Mas vemos milhares de políticos que detêm essas concessões. Essa relação as pessoas não conseguem fazer. Por exemplo, sai no jornal que o Renan Calheiros tem uma rádio em Alagoas. Mas as pessoas não conseguem entender e não têm uma informação necessária, porque a mídia não fala dela mesma, a não ser que seja para defender seus próprios interesses. As pessoas não se dão conta de que aquele coronel mantém o seu curral eleitoral naquela região, e usa aquilo como moeda de troca política e para dar manutenção ao seu poder. Por outro lado, a população já está lendo mais criticamente do que lia há algum tempo, até porque hoje em dia a mídia faz muito mais parte da vida das pessoas.
- Em tempo de eleições, aparecer na TV é muito importante. Isso não acaba determinando a política?Não há como pensarmos numa sociedade democrática sem comunicação democrática. E hoje em dia não podemos ter uma comunicação democrática sem reformar o sistema que está aí. Tanto que o Intervozes está envolvido numa luta mais ampla pela reforma política, que é uma reforma na democracia no seu sistema representativo e que inclui uma reforma partidária. A reforma política que foi discutida no Brasil está centrada na reforma político-partidária. Mas a discussão deixou de lado a própria mídia. Não pautou que esta reforma deveria ter sido uma reforma pensada na democracia em suas vertentes, representativa, participativa, direta e na democracia das comunicações. Sem pensar nestas quatro perninhas juntas, não vamos para lugar nenhum. Deixando brecha no sistema político-eleitoral, vamos continuar sem democracia na televisão e os partidos vão continuar fazendo alianças que não fazem sentido nenhum, ou existindo partidos que se transformam em partidos de aluguel.
- Com o marketing político, fazer propaganda de um político é como vender um produto?Já têm estudiosos e muita gente ganhando dinheiro fazendo isso. Por conta dessa necessidade da visibilidade, há políticos com assessoria de marketing até em períodos não-eleitorais: cuidando de como ele está aparecendo na mídia, se ele está aparecendo muito ou pouco, se ele está aparecendo positivamente ou negativamente. Sabemos o efeito que tem a propaganda política mesmo nas pessoas mais conservadoras ou resistentes à candidatura de determinado político. Não dá para negar esta nova era do fazer política, construir lideranças políticas através da comunicação, usando-a como instrumento, inclusive para construir coisas que às vezes não são reais. Constroem imagem de políticos, por exemplo, que simplesmente são fenômenos de mídia. No imaginário popular, isto pode ser confundido com a capacidade que a pessoa tem de resolver determinados problemas.
- Existe, atualmente, uma indiferença política?Eu acho que não. Quanto mais mecanismos você cria de controle público, monitoramento, principalmente das ações de parlamentares, mais vigilante ela fica. Quando há garantia de controles públicos, o controle vai aumentando, e a cultura de controles públicos vai se disseminando. Acho que faltam mecanismos públicos no Brasil. Os que existem, conselhos e conferências, têm problemas enormes que precisam solucionar, as formas da democracia participativa. Não existe uma cultura de plebiscito no Brasil e daí acontece como foi com o desarmamento, que a mídia fez uma campanha bem de direita, influenciando a opinião pública. As pessoas não estão desinteressadas pela política. Interessa à mídia reforçar, bombardear a população brasileira com escândalos políticos para fazer as pessoas desacreditarem da política. Quanto mais engajada a população estiver, mais força terá para fazer o controle público. E isso não interessa à mídia. O discurso de que o jovem não é interessado pela política é um discurso que interessa à mídia, mas não é o discurso da realidade. É importante o jovem entender o jogo político, brigar pela transformação desse sistema. Vejo na comunicação uma ferramenta e um ambiente para o jovem fazer isso. O jovem pode ajudar a mudar a realidade da comunicação no país. A juventude faz política do jeito que acredita ser viável, sendo sujeitos de um modo totalmente legítimo, fazendo política de outras formas. E é missão nossa de entender essas formas e ajudar a disseminar essas formas.
- Nas eleições, como os jovens, principalmente os novos eleitores, podem fazer suas escolhas?É necessário começar localmente. Primeiro, informando-se pelas mídias; só através da TV não é seguro, porque tem todas as irregularidades, falcatruas, alianças espúrias e o tempo de exposição. Tem que ler jornais e revistas com posicionamentos políticos diferentes para poder fazer uma análise comparativa, tirar as próprias conclusões, porque muitas vezes a pessoa encontra informações contraditórias sobre um mesmo candidato. A internet, hoje, não está acessível para todos, mas é uma ótima forma de pesquisar, inclusive, acabando com a mediação que os grandes veículos de comunicação fazem. Você pode ir diretamente ao site do político, ver o que ele faz... É importante pesquisar e comparar. Temos o jornal, a revista, a televisão e o rádio, mas se forem os que mais se ouve no Brasil, são todos da mesma empresa de comunicação e daí nesse caso receberemos destes variados meios, todas as mesmas informações. Todos têm a mesma linha editorial porque pertencem à propriedade privada. É importante informar-se com meios diversificados, de outras linhas editoriais, sobre as propostas de governo, a plataforma eleitoral do candidato, ver atuações anteriores, trocar ideias com outras pessoas, eleitores mais velhos, para acabar com esta mediação que a comunicação impõe através da mídia.
Nenhum comentário:
Postar um comentário